Boa tarde, quinta-Feira, 21 de Novembro de 2024
Casa do Ceará

Imprima




Ouça aqui o Hino do Estado do Ceará



Instituições Parceiras


































:: Jornal Ceará em Brasília


::Odontoclínica
Untitled Document

Março 2013

Estórias de sertão, estórias de cangaço

Com o olhar perdido, evocando reminiscências, ela contava, sob o olhar fascinado dos netos, que era tempo de férias quando se juntaram no pátio da Casa Grande mais de vinte cavaleiros, rapazes e moças, para uma viagem de léguas. Grande o alvoroço nos preparativos da aventura, com ansiedade aguardavam o instante da partida, inseguros os iniciantes na arte de cavalgar, a pedir explicações aos veteranos, habituados nas andanças pelas poeirentas estradas do Nordeste. Aos mais tensos e medrosos foram designados os animais mais lentos e mansos, enquanto os mais excitados e ariscos foram dados aos cavaleiros acostumados a longas galopadas. Treinados uns, desajeitados outros, foram um a um montando o seu cavalo, e ela ficou de fora, desapontada! Faltava um animal, e ela, tristemente, já se preparava para assistir a debandada festiva, quando um amigo da família, em visita, ofereceu-lhe belo animal, com uma condição. Tinha que montar muito bem. O animal, arisco em demasia, ele dizia, era um puro sangue, acostumado a disputar nas pistas os primeiros lugares! Não poderia o cavaleiro, em passeio, dar tréguas no manejo das rédeas.Firmeza no pulso, segurando-as sem favorecer o animal, não deixando-o avançar, livremente. Convencida de que cavalgava com mestria, era a melhor de todos, não hesitou, rapidamente se sentou à sela e pôs-se a caminho, se juntando aos demais. Boa amazona, habituada a montar, logo esqueceu das recomendações, afrouxou as rédeas, deixou o animal um pouco mais solto, e de leve no galope. Foi quando dois lhe passaram à frente, e mais velozes, se distanciaram. Num segundo, sem que pudesse conter as rédeas e puxar o freio, ela se viu à mercê do animal, em desabalada carreira ultrapassando os outros, e galopando a toda, sem parar! Tomara o freio nos dentes! Costume dos velhos tempos, montada de lado, tentou a custo se manter no silhão, sentindo que já não tinha o comando e nem dominava o animal. Julgou-se perdida, deixando para trás, amigos, árvores, cercas, estrada!

De repente irrompe, nem sabe de onde, um vulto, e ela vê que do alto da ribanceira, num salto se joga à frente, tentando segurar as rédeas e o freio do animal que recua, corcoveia e empina! A custo, vencido e dominado!

Trêmula, quase sem poder falar, ela vê, se refazendo do susto, que ele traz à altura do peito, do pescoço à cintura, larga cartucheira, e pelo aspecto reconhece, de imediato, o famoso personagem pertencente ao bando do Lampião! Em visita aos parentes, andava pelas redondezas da Serra de Guaramiranga! Não podia, ali, deixar transparecer o seu pavor, e desejo de fugir! Restava-lhe disfarçar o medo e esperar pelos outros. Demora de uma eternidade, tanta a agonia.

Grande foi o constrangimento do dono das terras, chamado para atender a emergência, ao reconhecer no cangaceiro, filho do seu caseiro, o salvador da sobrinha mais querida. Um agradecimento formal foi – lhe feito, com promessa de gratificação, que ele, cheio de brio, recusou. E a viagem prosseguiu, plena de excitação, e sem mais sobressaltos, que já bastava a intervenção de um homem do cangaço.

De certo modo, verdade, devo-lhe muito. Salvou a vida de minha mãe, ainda adolescente. E, certamente, favoreceu também a minha vida. Mas, longe a idéia de lhe levantar em praça pública uma estátua, como pretenderam, há tempos, os moradores de Serra Talhada, pequeno município onde nasceu Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião! Em sua homenagem pretendiam alguns erguer uma estátua de quarenta metros, sob o pretexto de que Lampião é história e cultura, e merece homenagens, além de levar turistas e visitantes à cidade.Protestando, o prefeito alardeava a sua pretensão de investir em áreas mais prioritárias, educação, saneamento, sob o aplauso dos mais jovens que divulgavam as perversidades do Lampião e seus asseclas. Divididas as opiniões em Serra Talhada, a alguns quilômetros do Recife, o cangaceiro foi figura de destaque, polêmica cerrada entre a população. Das divergências, quem ganhou quem perdeu, nada sei.

Houve um tempo em que as homenagens eram feitas aos heróis, aos cientistas, aos poetas, homens que acrescentavam ao mundo com o seu talento e a sua capacidade, abnegação e desprendimento. Nos tempos que correm, numa cidade do interior se faz um plebiscito para se aprovar a construção de uma estátua a um cangaceiro, bandoleiro do sertão que passava incendiando, pilhando, destroçando fazendas, plantações, suscitando pavor! Uma estátua a um homem do cangaço!

Triste sinal dos tempos!

(*) Regina Stella (Fortaleza), jornalista e escritora

Untitled Document

Regina Stella S. Quintas
Jornalista e Escritora
studartquintas@hotmail.com

                                            
:: Outras edições ::

> 2015

– Outubro
Camaleões à solta

–Setembro
Um instante de Solidariedade

> 2015

– Novembro
Coronel Chichio

– Outubro
Uma ponte...

– Setembro
Um verbo para o encantamento

Agosto
Há vida lá fora...

> 2014

Setembro
Seca: a tragédia se repete
Agosto
Seca: a tragédia se repete
Julho
Gente brava
Junho
Dia da Alegria
Maio
Precioso bem
Abril
Aquele velho “OSCAR”
Maro
Estórias de sertão, estórias de cangaço
Fevereiro
Recado para quem sai
Janeiro
Rota para a vida

> 2013

Dezembro
Na festa do tempo, um brinde à vida
Novembro
Em velha trova do tempo. Trinta dias tem setembro. Abril, junho, novembro...
Outubro
O Gênio e o Homem
Agosto
O Gênio e o Homem
Julho
Um presente de vida a Mandela!
Junho
Dia da Alegria
Maio
Precioso bem
Abril
Aquele velho “OSCAR”
Maro
Estórias de sertão, estórias de cangaço
Fevereiro
Recado para quem sai
Janeiro
Rota para a vida

> 2012

Dezembro
As lições de amor e ternura fazem eterno o Natal
Novembro
As luzes estão acesas
Outubro
Amarga ironia
Setembro
O trono vazio
Agosto
A última trincheira
Julho
Parece que foi ontem...
Junho
Atores de todos os tempos
Maio
Seca: a tragédia se repete
Abril
Imaginação ou realidade?
Maro
Um Século de Sabedoria
Fevereiro
Trágedia e Carnaval

> 2011

Novembro
Trilhas da vida
Setembro
Um mercenário a caminho
Agosto
Usar sem abusar
Julho
Como as aves do céu
Maio
Quem se lembra de Chernobil?
Junho
Sino, coração da aldeia...
Maio
Maio, cada vez menos Mês de Maria, está indo embora...
Abril
Bonn, Bonn
Fevereiro
Depois da festa...
Janeiro
Um brinde ao Novo Ano

> 2010

Dezembro
Nos limites de um presente,um presente sem limites
Novembro
Homem total
Outubro
Estórias de sertão, estórias de cangaço
Setembro
Um tempo que se perdeu
Agosto
Império do Medo
Julho
Acenos de Esperança
Junho
Maio, cada vez menos Mês de Maria, está indo embora...
Maio
Poema Impossível
Março
Numa tarde de verão
Fevereiro
Caminhos de ontem
Janeiro
Muros de Argila

> 2009

Dezembro
Um Brinde Vida
Novembro
A vez da vida
Outubro
Gente brava
Setembro
Gente brava
Agosto
Lição de vida no diálogo dos bilros
Julho
Camalees solta
Junho
Síndrome de papel carbono
Maio
Um tempo que se perdeu


:: Veja Também ::

Blog do Ayrton Rocha
Blog do Edmilson Caminha
Blog do Presidente
Humor Negro & Branco Humor
Fernando Gurgel Filho
JB Serra e Gurgel
José Colombo de Souza Filho
José Jezer de Oliveira
Luciano Barreira
Lustosa da Costa
Regina Stella
Wilson Ibiapina
















SGAN Quadra 910 Conjunto F Asa Norte | Brasília-DF | CEP 70.790-100 | Fone: 3533-3800 | Whatsapp 61 995643484
E-mail: casadoceara@casadoceara.org.br
- Copyright@ - 2006/2007 - CASA DO CEARÁ EM BRASÍLIA -