Agosto 2008
Acopiara – Ezequiel partiu e deixou saudade
É agradável e confortante escrever sobre um homem de bem. Desses que parecem espécie em extinção, numa sociedade individualista, predadora e autofágica.
Ezequiel Albuquerque de Macedo (Acopiara, 1921- Fortaleza, 2008) se enquadra neste perfil, por suas qualidades e virtudes, exercitadas ao longo de seus 87 anos bem vividos entre Acopiara e Fortaleza, com dignidade, caráter, fildalguia e simplicidade.
- “Aglais, não me deixe morrer à míngua”, foram algumas de suas últimas palavras dirigidas à Aglais, com quem conviveu por 61 anos, desde que a conheceu numa festa de São João, em 1947, na casa de Pedro Alves..
- ” Você não está à míngua. Eu, seus filhos e netos estamos aqui”.
Morreu ao lado do melhor de sua vida, sua família.
Nascido no sítio Timbaúba, a 8 km de Acopiara, no berço das famílias Albuquerque e Macedo, filho de Joaquim Alves de Albuquerque e Francisca Alves de Macedo, que também dominaram Barbatão e Minadouro, foi ali alfabetizado, indo depois estudar em Canindé com os franciscanos, no Crato no Gináasio Diocesano e em Fortaleza onde concluiu o colegial no Liceu e odontologia na Faculdade, em 1948. Suas duas irmãs; Maria Albuquerque de Macedo, 88 anos, viva, esposa de Azarias Felício de Albuquerque, e Izaura Albuquerque de Macedo.
Com o canudo de cirurgião dentista na mão, tentou trabalhar em Catarina, mas ao se casar, em 1949, voltou a Acopiara, instalando seu consultório na rua Marechal Deodoro, entre os irmãos Júlio e João Holanda. Deve ter sido o 2º dentista da cidade, mas 1º dali natural.
Com o afã e o entusiasmo dos jovens que sonham resolver os problemas do mundo, tentou a política, dominada em Lages, Afonso Pena e Acopiara por venerandos e respeitados caciques. Em 1947, na redemocratização do país, depois do Estado Novo, estimulado por seu futuro sogro e cacique da UDN local, José Marques Filho, buscou, ainda estudante, a prefeitura, disputando com Celso de Oliveira Castro, cacique do PSD e o aprendiz de cacique do PSP,, dr. Tiburcio Valeriano Soares Diniz “Seu” Celso, “prático de farmácia”, o mais eficiente político que apareceu naquele território, ganhou dos dois “doutores”. A derrota não o desanimou. Em 1950, voltou a disputar a prefeitura .pela UDN, perdendo para o dr. Tibúrcio, PSP/ PSD, apoiado por “Seu” Celso.
As duas derrotas seguidas levaram-no a desistir da política, mas não do ideário político da UDN, o partido criado por Vargas mas que desencadeou uma oposição tão cruel que o levou ao suicídio. Nem a vereador quis se candidatar.
Voltou-se para a família, o consultório e a Timbaúba, inicialmente com seu pai e depois sozinho, cuidando do gado, da criação, das plantações, do açude.
Uma pausa: foi o primeiro dentista que encarei, levado pelo meu pai. Chorei muito, mas ele me imobilizou e Ezequiel com um olho na broca e outro no pedal que movia a broca tapou um buraco aberto por uma cárie. Era a tecnologia da época em que o ferrinho de dentista era o terror! . Nunca mais lá voltei. Sai de Acopiara em 1954 para o Crato e em 1958 para Fortaleza. Ezequiel lá ficou com régua e compasso.
Em 1958, o prefeito Alfredo Nunes de Melo, da UDN, tio dele, apoiou fortemente a instalação do ginásio privado, Monsenhor Coelho, e convocou a irmã de Ezequiel e sua sobrinha, Izaura, para ser a 1a; diretora. Em 1961, o ginásio formou sua 1a. turma e Ezequiel tornou-se seu 2º diretor, inaugurando uma longa trajetória de educador que durou 36 anos.Neste ofício revelou-se a principal referência educacional de Acopiara, com um legado reconhecido por várias gerações que freqüentaram suas aulas de Matemática, Inglês e Ciências.
Como udenista convicto, transitou sem dificuldade pela hegemonia pessedista da cidade, supervisionada pelo vigário, padre João Antonio, que se não tinha inimigos, colecionava desafetos udenistas.
Dedicado à família, comprou uma casa à Rua Otávio Justa, no Parque Araxá em Fortaleza, base para a formação de seus 12 filhos: dois médicos, dois agrônomos, dois engenheiros, dois dentistas, duas funcionárias públicas, uma enfermeira e um administrador de empresa. “Um paizão, atento, cuidadoso, sem ser severo, amoroso, atencioso, amigo”, afirma Maria Auxiliadora, enfermeira que migrou para Brasília onde trabalha no serviço médico do Itamaraty.
Quando descobriu que a velhice o pegara dividiu-se entre Fortaleza, babando filhos, netos e familiares como o sobrinho Celso Albuquerque de Macedo que viu chegar a desembargador, e Acopiara, vendo o tempo passar, conversando, ouvindo, sugerindo, propondo.
Fez da calçada em frente à sua casa, em Acopiara, uma sala de visitas ou uma passarela por onde os passantes, vizinhos, amigos, correligionários, familiares exercitavam noite a dentro a memória de fatos passados, indagavam sobre fatos futuros, praticavam a amizade, valorizavam a vida debatendo a atualidade em Acopiara, no Ceará, no Brasil e no mundo globalizado.. Manso, cordato, pacato, sabia ouvir com atenção e respeito e quando falava media e encaixava seus pensamentos com sobriedade, elegância e propriedade.